Não é de hoje que a falta de equidade entre homens e mulheres é pauta de discussões – principalmente no ambiente corporativo. A diferença da tratativa entre os dois gêneros ainda hoje é relevante e isso reflete-se disparidade salarial entre homens e mulheres. Veja as profissões com maior nível de disparidade e o que podemos fazer para mudar esse cenário.
Mulheres e o mercado de trabalho: a desigualdade
Não há dúvidas que houve, nas últimas décadas, uma modificação social, econômica e política, inserindo as mulheres no mercado de trabalho e criando maior liberdade e direitos femininos. Isto resultou na inserção da mulher no mercado de trabalho formal, bem como na escolaridade de forma geral. Deixamos de ser somente as esposas que cuidam da casa e dos filhos, sendo sustentadas pelos maridos, para termos o direito ao voto, ao estudo, a uma profissão e passamos a ter voz ativa na maioria dos lares. Se antes o trabalho feminino serviria somente para complementação de renda, hoje temos muitas famílias que dependem totalmente destes rendimentos e as mulheres se tornarem chefes de família.
Entretanto, isso ainda não é suficiente. De acordo com levantamento realizado pela IDados, mencionado em uma reportagem publicada pelo G1, a disparidade salarial persiste. As mulheres ainda ganham em média 20,5% a menos que os homens segundo dados do IBGE, mesmo tendo o mesmo cargo e possuindo o mesmo perfil de escolaridade e idade.
Esta disparidade salarial se acentua nas áreas de tecnologia, ramo majoritariamente masculino: chega a 63,2% para um desenvolvedor de Front-end, por exemplo, de acordo com a pesquisa. A medida que o nível hierárquico cresce, também aumenta a diferença entre os rendimentos. Mesmo que as mulheres possuam maior escolaridade em relação aos homens e maior presença em cursos de ensino superior, os postos ocupados nas áreas de exatas ou docência no ensino superior ainda são baixos.
Veja o ranking das funções com maior disparidade salarial entre homens e mulheres, na qual o homem ganha mais:
- Desenvolvedor Front-end: 63,2%
- Técnico Administrativo: 58%
- Gerente Geral: 57,9%
- Supervisor de Produção: 56,3%
- Supervisor de Vendas: 43,4%
- Auxiliar de Manutenção: 41,7%
- Engenheiro Civil: 38,6%
- Gerente de Projetos: 36%
- Analista de Qualidade: 35,8%
- Comprador: 31,2%
- Corretor de imóveis: 29,67%
- Coordenador financeiro: 28,67%
- Assistente de marketing: 26,68%
- Encarregado de logística: 26,39%
- Analista de cobrança: 25,13%
- Assistente comercial: 24,3%
- Engenheiro químico: 23,64%
- Vendedor externo: 23,14%
- Gerente administrativo financeiro: 22,48%
- Ajudante de cargas: 22,18%
A dupla jornada
Estes dados são um reflexo da sociedade atual. Apesar do aumento da escolaridade para mulheres, isso não se reflete no mercado de trabalho. A idéia pré-concebida de que a mulher tem “vocação” somente para a área de humanas e outras mais relacionadas ao que julgam como funções femininas (como enfermagem, por exemplo) nos afasta de profissões do campo de exatas. Somos condicionadas desde cedo a ser aquela que cuida dos filhos e mantém o lar. Quem de nós nunca foi presenteada com uma boneca ou brincou de “casinha” na infância? Somos, desde cedo, desestimuladas a nos interessar por ciências e tecnologia e orientadas a atividades relacionadas ao cuidado do outro. A segregação entre meninos e meninas já começa no nascimento.
Além disso, temos a dupla – ou tripla – jornada. Além do trabalho remunerado, temos também a rotina de trabalhos domésticos e os cuidados com os filhos ou com a família de modo geral. De acordo com texto da Agência Brasil, a jornada média de trabalho em casa é de 22 horas semanais, além do remunerado que em média é de 08 horas por dia.
Um dos fatores que nos afasta dos cargos de poder é justamente a dupla jornada. Com a responsabilidade sobre a gestão da casa e criação dos filhos transferida quase integralmente para a mulher, é comum que elas abandonem seus postos de trabalho, por pelo menos algum tempo. Isso acontece devido à falta de mecanismos de suporte às crianças, como creches, e também de políticas públicas voltadas às mães. Na volta ao mercado de trabalho, é comum que haja certa defasagem de atualização sobre a profissão. Não é atoa que as mulheres estão tendo menos filhos e cada vez mais tarde, para priorizarem suas carreiras. Porém, não deveríamos ter que fazer tal escolha.
Outro ponto importante é a discriminação sobre a mão de obra feminina, em detrimento à lei 1723/52 de consolidação das leis trabalhistas em seu artigo 461:
“Art. 461. Sendo idêntica a função, a todo trabalho de igual valor prestado ao mesmo empregador, na mesma localidade, corresponderá igual salário, sem distinção de sexo, nacionalidade ou idade.”
Como mudar?
A disparidade salarial entre homens e mulheres precisa ser debatida. Só de aumentar a discussão sobre o tema e trabalhar para que todas as pessoas tenham maior conhecimento sobre o assunto, já é uma evolução em relação aos anos anteriores. Tudo que não é visto, não pode ser melhorado. É importante que todas nós sejamos conscientes dos nossos direitos para que possamos exigi-los, nos empoderar e buscar formas de avançar nas pautas colaboram por um mundo mais justo. Devemos lutar contra a falta de informação e a favor do cumprimento da lei, sempre.
Já existe o movimento de mudança desse quadro no meio corporativo, vindo principalmente das áreas de RH das empresas. Mas é necessário que o trabalho para corrigir essa diferença seja tratado com urgência ou, segundo aponta o Fórum Econômico Mundial de 2020, podemos demorar mais de 257anos para que a disparidade salarial entre homens e mulheres desapareça.
Este é o momento destas empresas mudarem os conceitos e formas de lidar com a situação, ou perderão mão de obra qualificada e motivada.
Na prática, são ações simples que podem fazer a diferença. Por exemplo, em um processo seletivo, é importante trazer mais diversidade no quatro de funcionários. Outro ponto seria o treinamento interno de políticas de diversidade para que essas pessoas se sintam acolhidas, representadas e consideradas dentro da empresa.
O incentivo à candidatura de vagas por mulheres também é um ponto a ser levado em consideração. Segundo o informe de percepção de gênero, divulgado pelo LinkedIn em 2018, as mulheres se candidatam a uma vaga somente se forem capazes de preencher todos os pré-requisitos. A maioria dos homens, entretanto, precisam apenas preencher 60% para sentirem-se aptos a ocupar uma vaga. Isso é um dos fatores que prova o quanto a síndrome do impostor ataca mais mulheres do que homens, e como este é um sintoma que tem causas ligadas diretamente à nossa estrutura de sociedade.
Além da mudança no mercado de trabalho, também é fundamental que haja também a mudança da cultura em geral. No fim das contas, é a cultura que coloca a mulher como a única responsável pela casa e filhos, por exemplo. A educação é fator essencial para transformação dessa realidade.
Algo grandioso é que nós, mulheres, possamos dar suporte e incentivar outras mulheres. A Mulheres no Comando é uma ferramenta incrível de empoderamento feminino, onde todas se apoiam e ajudam umas às outras. Coisa linda de se ver, e viver.
Cabe a todos a virada de chave sobre a capacidade das mulheres e nosso espaço no mercado de trabalho. Cada um fazendo a sua parte, e criando um presente melhor e um futuro mais igualitário para todes.
Artigo escrito por Viviane Duarte, mentora do Mulheres no Comando.